sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Em defesa dos Contos de Fadas

A pouco tempo estive lendo "As Crônicas de Nárnia" e notei alguns narizes torcidos para o meu lado, além de alguns vagos comentários (principalmente no ônibus, onde mais leio). Em sua maioria falavam por serem as crônicas voltadas para um público infantil, e ainda por cima o próprio autor definiu a obra como "Conto de fadas". Não é um costume meu me importar com comentários, mas apenas dessa vez faço questão de dar uma resposta àquelas pessoas que se julgam muito adultas para contos de fadas. Para tanto faço minhas as palavras de C.S. Lewis:
"Hoje em dia as pessoas usam o adjetivo “adulto” como marca de aprovação. São hostis ao que denominam “nostalgia” e têm absoluto desprezo pelo que chamam de “Peter Panteísmo”. Por isso, se uma pessoa que já não é mais uma criança admite adorar anões, gigantes, bruxas e animais falantes é muito provável que seja ridicularizada e lamentada por seu retardamento mental. Não me importo muito em ser ridicularizada e lamentada, mas quero uma oportunidade de defender, não apenas à mim, mas a todos aqueles que como eu não cansam das histórias “infantis”. Essa defesa consiste em 3 proposições:
1. As pessoas para quem a palavra “adulto” é um termo de aplauso, e não um simples adjetivo descritivo, não são nem podem ser adultos. Preocupar-se em ser adulto ou não, admirar o adulto por ser adulto, corar de vergonha diante da insinuação de que se é infantil: esses são sinais característicos da infância e da adolescência. E na infância e na adolescência, quando moderados, são sintomas saudáveis. É natural que os mais novos queiram crescer. Porém, quando se mantém na juventude e mesmo na meia-idade, essa preocupação em “ser adulto” é um sinal inequívoco de retardamento mental. Quando eu era menor lia e assistia filmes de contos de fadas e ficava envergonhada quando me pilhavam. Hoje em dia leio-os e assisto-os abertamente. Quando eu era criança, agia como criança; quando cresci, deixei para traz as coisas de criança, inclusive o medo de ser infantil e desejo de ser muito adulto.
2.A visão moderna, a meu ver, envolve uma falsa concepção de crescimento. Somos acusados de retardamento porque não perdemos o gosto que tínhamos na infância. Mas, na verdade, o retardamento consiste não em recusar-se a perder as coisas antigas, mas sim em não aceitar as coisas novas. Hoje eu gosto de barras de cereal, coisa que eu tenho certeza que não gostaria quando criança, mas não deixei de gostar de barras de chocolate. Chamo esse processo de crescimento ou desenvolvimento porque ele me enriqueceu: se antes eu tinha um único prazer, agora tenho dois. Porém se eu tivesse de perder o gosto por barras de chocolate para admitir o gosto por barras de cereal, isso não seria crescimento, mas simples mudança. Hoje em dia já não gosto somente de contos de fadas, mas também de José de Alencar, Machado de Assis e Shakespeare e chamo isso de crescimento, se tivesse precisado deixar de lado os contos de fadas para apreciar os romancistas, não diria que cresci, mas que mudei. É verdade que o processo de crescimento, por acaso e por infelicidade, acarreta outras perdas. Porém essa não é a essência do crescimento, e certamente não é o que faz do crescimento algo louvável ou desejável. Certas pessoas parecem confundir o crescimento e gostariam de tornar esse preço muito mais alto do que ele naturalmente deve ser.
3.A associação dos contos de fadas e histórias fantásticas com a infância é um fenômeno local e acidental. Em quase todas as épocas e lugares, o conto de fadas não eram feitos especialmente para crianças nem ao menos desfrutados exclusivamente por elas. Só se deslocou para a escola maternal quando caiu de moda nos círculos literários, tal como, nas casas vitorianas, a mobília que caía de moda ia para os quartos das crianças.
Por último, inclino-me quase a afirmar como regra que uma história para crianças de que só as crianças gostam é uma história ruim. As boas permanecem. Uma música da qual você só gosta enquanto está tocando não é uma boa música. O mesmo digo dos contos infantis."